Desconsideração da personalidade jurídica
A personalidade jurídica é um atributo ficto criado pelo direito que impõe a observância das normas jurídicas.
Quando subvertida a personalidade jurídica atribuída pelo direito, pode ser pelo mesmo transitoriamente desconsiderada. Esta situação excepcional ocorrerá quando a autonomia patrimonial for usada para acobertar práticas fraudulentas dos sócios.
A teoria não faz desaparecer a pessoa jurídica e tem por finalidade coibir a malícia e os abusos dos sócios que buscam transformar a sociedade em instrumento para a prática de atos ilícitos.
Simples indícios ou presunção, inadimplência ou insuficiência patrimonial da sociedade, não basta para ensejar a desconsideração da personalidade jurídica; reclama-se a ocorrência de práticas ilegais ou de atos fraudulentos.
A medida deve ser aplica com cautela, evitando-se o risco de destruir o instituto da pessoa jurídica e lesionar os direitos dos sócios.
O Código Civil de 1916 não regulava o assunto. Assim, com a intenção de impedir que a personificação jurídica fosse instrumento para assegurar a impunidade de atos sociais fraudulentos, a jurisprudência passou a adotar a teoria da “desconsideração da personalidade jurídica”, possibilitando a responsabilização direta e ilimitada do sócio por obrigação que, em princípio, era da sociedade. Um exemplo: numa execução, o desaparecimento de bens da sociedade ou sua negociação de forma irregular; constatando-se a ocorrência de fraude, pode o juiz desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade, determinando a penhora de bens dos sócios para satisfazer as obrigações sociais.
De certa forma o Código Tributário Nacional já trouxera, em seu art. 135, III, o embrião da teoria ao atribuir responsabilidade aos diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos.
A teoria entrou para o Direito positivo brasileiro no Código de Defesa do Consumidor, Lei N° 8.078, de 11.09.1990, que assim dispôs:
“Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a pessoa jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também poderá ser efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.”
E por último o Diploma Civil de 2002 abarcou parcialmente a teoria da desconsideração da personalidade jurídica, regulando a hipótese de abuso da personalidade jurídica, caracterizada pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, como dispôs em seu artigo 50:
“Art. 50. Em caso de abuso de personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.”
Nelson dos Santos
Advogado